quinta-feira, abril 27, 2006

Conto

“Como ser fotógrafo de guerra: a câmera como vínculo com o conflito”. O título por si só não lhe levaria a ler o artigo da revista do avião, embora o assunto fosse até interessante. No entanto, naquela tarde, indo para sua cidade natal para enfrentar o funeral e enterro de sua mãe, seu ânimo não estava muito para textos interessantes.

O que realmente lhe chamou a atenção ao texto, foi o nome do autor: Roberto Gomes. Também conhecido como seu irmão. Achou que poderia ter uma idéia, mesmo que distante, de quem era o irmão. Não o que o levava a ter a profissão que tinha – isso ele já havia desistido há muito tempo –, mas sim quem ele era.

Dois irmãos, personalidades diferentes. Nada mais clichê do que isso, mas ainda o incomodava. E incomodava ainda mais no dia de hoje, ao perceber que teria que ligar para ele e contar do ocorrido.

Ainda se lembrava de como foi quando seu pai morreu. A falta de emoção no rosto do irmão, sua insensibilidade com o que acontecia à sua volta, como se tudo fossa apenas um grande inconveniente.

E a máquina fotográfica. Por que levar a maldita máquina para o funeral? Ficou tirando fotos adoidado, uma atrás da outra. Aquilo lhe incomodou tanto que passou todo o cerimonial evitando olhar para o irmão.

Depois do enterro, ainda aquele rosto impávido, fleumático. Quando questionado o porquê de tanto desdém pelo pai, a resposta de seu irmão veio como uma citação: “Eu não amava, mas ansiava por amar”.Mais tarde descobriu se tratar de uma frase de Santo Agostinho, mas naquele momento, aquelas palavras soaram tão hediondas aos seus ouvidos que decidiu não mais falar com o irmão.

E tem sido assim desde então. O dia de hoje veio para mudar isso – pelo menos temporariamente. Tinha que ligar pro irmão, onde quer que ele estivesse – provavelmente em mais um país imundo da África onde as pessoas ficam se matando dia após dia.

Ao chegar a sua antiga casa, foi direto ao telefone. Queria se livrar logo daquilo. A conversa não foi das melhores. Nem tanto pela distância física da ligação, quanto pela distância psicológica – seu irmão passou a ligação inteira sem alterar seu tom de voz, monocórdio, enquanto ele se debulhava em lágrimas.

Ao final da ligação, sentiu-se pequeno. Pequeno e só.

Três dias depois, quando finalmente se encontram, a promessa feita ao final da ligação de não mais chorar na presença do irmão se esvai junto com suas lágrimas. Seu irmão tenta lhe consolar com uma fleuma que chega a lhe agredir. Quando não suporta mais a impassividade do irmão, começa a gritar com ele. Acusa-o de ter visto tanta morte, tanta desgraça, tanta merda nos países por onde viaja que não consegue sentir mais nada, nenhuma emoção. O irmão escuta tudo, de olhos fechados, sem falar nada. Quando termina de gritar, vê apenas o irmão abrir os olhos (tão sem vida quanto antes daquele show todo) e ir embora, calado.

No funeral, um déjà vu – seu irmão aparece acompanhado da câmera. Assim que avista o caixão, leva-a em direção ao olho e começa sua série interminável de fotos. Ele não se sente mais com força para tomar uma atitude a respeito – não depois do tanto que já havia chorado e ainda chorava. Resolveu apenas torcer para não ser capturado pela câmera de seu irmão.

No entanto, a raiva era tanta que não conseguia tirar o olho dele. Que absurdo, falta de respeito e insensibilidade frente ao momento, frente à dor das pessoas ali. Afinal de contas era a MÃE deles quem estava no caixão!

Então percebeu. Seu irmão, atrás da câmera, chorava. Quando tirava a câmera da frente, seu rosto continuava impassível, mas as lágrimas estavam lá. Sim, não era uma ilusão. Frente àquela cena, levantou-se e abraçou o irmão. Permaneceram assim, abraçados e sem trocar uma palavra, até o caixão ser enterrado e todos irem embora.

No dia seguinte, ao acordar, soube que seu irmão já havia retornado ao trabalho. Deixou-lhe um bilhete.

“Se há uma coisa que aprendi durante todos esses anos na minha linha de trabalho, foi que sou muito fraco. Não suporto a dor. Por isso evito senti-la. Descobri também que minha câmera é meu bem mais precioso, meu escudo, minha proteção da dor. Para mim, a dor é insuportável demais para ser vista diretamente pelos meus olhos”.

segunda-feira, abril 17, 2006

Segunda não é dia de bobó

- Foi você quem molhou o banheiro todo?
- Sim, saí do banho e molhei um pouco.
- Que bom! Então você deixou aqui tudo molhado pra outras pessoas apreciarem a merda que você fez?
- Estava me vestindo pra vir limpar.
- Sei...

...

- O que você ta fazendo?
- Enxugando o chão do banheiro.
- Com o paninho de chão!?
- Qual é o problema?
- O paninho de chão do banheiro não é pra enxugar o chão do banheiro!!!
- Não?
- Não! É pra usar um pano de chão lá fora!!!
- (Cara de ponto de interrogação)
- O que você ta esperando!?
- Pra que serve então o paninho de chão do banheiro?
- Não importa! O que importa é que não é pra usá-lo pra limpar o chão do banheiro!


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- Amanhã vou fazer bobó de camarão pra gente comer.
- Legal! Faz tempo que você não faz bobó!
- Então ta marcado: amanhã a gente acorda às 6:00, vai ao mercado de São Pedro, em Niterói, compra o camarão e eu faço.
- Não posso ir amanhã de manhã lá. Fiquei de ajudar um amigo a se mudar amanhã de manhã.
- Hunf.
- Mas a gente vai lá à tarde e come à noite.
- Não.
- Ué, por que não?
- Jantar não é pra comer! É pra lanchar!
- A gente não pode fazer uma refeição à noite?
- Não! É pra lanchar!
- Ok. Comemos o bobó na segunda então.
- Não! Segunda não é dia de comer bobó!
- Hã?


OBS.: Os palavrões foram retirados do texto. Foi uma escolha editorial para facilitar a leitura e diminuir o texto (originalmente de 500 linhas). Obrigado.

terça-feira, abril 11, 2006

Eu sou um cara preguiçoso. Por natureza.

Por muitas vezes isso acabou me atrapalhando na vida, de uma forma ou de outra. Ainda atrapalha. Mas tem seu lado bom.

Por ser preguiçoso odeio fazer esforço, principalmente o desnecessário. Na verdade, odeio só o desnecessário - o necessário eu geralmente o faço com prazer.

Isso acabou me levando a desenvolver um senso prático grande (bom, tem funcionado pra mim... Mais ou menos...). Não há como evitar fazer alguma coisa da vida: trabalhar, estudar, namorar, se relacionar, fazer compras, etc. Tudo isso depende de um esforço para ser realizado.

Eu acabei prestando atenção a essas "tarefas" e percebendo o que era necessário ser feito ou não. Dessa forma, tornei as tarefas mais rápidas, menos trabalhosas e, em muitos casos, mais eficientes.

As exceções é que são legais! Como quando eu tinha 10 anos e decidi que escovar os dentes dava muito trabalho. Ficar com a escova pra frente e pra trás, pra um lado e pro outro, pra cima e pra baixo... Ainda por cima nas horas de maior lezeira: depois de acordar, depois do almoço e antes de dormir. Não podia continuar daquele jeito!

Após muita análise, resolvi que não mais mexeria minha mão. Mexer a cabeça, ao invés, me daria menos trabalho!

Resumo da história: passei quase uma semana tentando o novo método. Óbvio que não funcionou desde a primeira tentativa, mas eu tinha que insistir!

Só o que consegui foi ficar com dor de cabeça toda a vez que escovava os dentes...